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Como se aprende a gostar de ler? Como descobrir prazer na História? Este sítio destina-se principalmente aos alunos do 2º ciclo, tanto aqueles que amam os livros e são entusiastas pela história como os outros que poderão vir aqui a descobrir que afinal para gostar é preciso tentar.

Ilustração: Ivan Zigg

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Entrevista a Alice Vieira

Entrevista efetuada a Alice Vieira por Ana Teresa Ferreira, em que esta escritora considera que os livros foram fundamentais na sua "infância complicada" e deve-lhes todos os bons momentos, porque através deles, aprendeu a viver, a vencer os medos, e a ganhar as suas próprias forças.

“A leitura é um prazer enorme.”


          Alice Vieira…   terra a terra
          A senhora das estórias gosta de ter os pés em terra. Natural de Lisboa, […] Alice Vieira é uma das mais conhecidas e editadas escritoras infantis e juvenis portugueses. Alguns dos seus livros tornaram-se já clássicos de leitura –«Rosa, Minha Irmã Rosa», «Este Rei que eu Escolhi», «Os Olhos de Ana Marta». Existe nela, e vão percebê-lo nesta entrevista, um airoso despacho de expectativas e lugares comuns e uma veemente afirmação do gosto pela leitura. Faz-se acompanhar das palavras de Erico Veríssimo e dos seus poetas de eleição e - sempre ocupada entre novas edições, a divulgação junto a escolas, e novos projectos de escrita - divaga apenas quando se lembra das horas de sono que a Bela Adormecida de lhe leva de avanço... Não parece contudo ter vontade alguma de parar. Há aqui um singular entranhado de palavras e vida, fugas e encontros, força e solidão. Com mais dezenas de títulos editados entre o romance, a poesia, o conto e o teatro, distinguida com o Grande Prémio Calouste Gulbenkian de Literatura para Crianças, e fazendo parta da lista de honra do IBBY (International Board on Books for Young People), Alice Vieira aceitou falar um pouco de si.  

Círculo de Leitores (CL) - Também se cresce (e vence medos) lendo?
Alice Vieira (AV) - Os livros foram a minha tábua de salvação numa infância complicada. Foi com eles e através deles que aprendi a viver, a arranjar maneiras de enganar os medos, a angústia, o sobressalto. Todas as horas boas da minha infância a eles as devo. Ensinaram-me a não desesperar,  e sobretudo a encontrar forças em mim própria, a nunca esperar nada dos outros e tudo de mim. Foi uma lição para a vida inteira.

CL - Existe uma personagem que a aterrorize ainda hoje?
AV - Não me lembro de ter medo de alguém ou de alguma personagem. Lembro-me de ter medo dos barulhos do corredor da casa onde vivia, que era enorme e rangia quando as tias andavam para lá e para cá, de madrugada, a ver se as insónias passavam. E tinha pesadelos, imaginando que uma mão vinha de debaixo da cama para me agarrar.

CL - Se tivesse de atravessar uma floresta negra, sozinha, de quem se faria acompanhar?
AV – Se calhar era poético responder: “de uma fada que, com a varinha de condão resolvesse todos os problemas”. Mas, terra a terra como sou e sempre fui, preferia a companhia de um guarda-florestal conhecedor do sítio... (Já agora, loiro, de olhos azuis, e do Benfica...)

CL - A Alice marcou já tanto o imaginário de todos nós. Queria contudo perguntar-lhe de que forma a marca a si a escrita?
AV - A minha escrita foi sempre a minha profissão. Nunca tive outra. Para além disso foi sempre a minha maneira de contactar com os outros. Desde muito cedo. É uma ligação muito pragmática: precisava das palavras escritas para sair donde estava e atingir quem eu queria e estava longe. Lembro-me de ter sempre escrito muitas cartas. Quando era criança fascinavam-me os actores de teatro, que as minhas tias me levavam a ver ao Teatro Nacional. E depois escrevia-lhes. E eles respondiam-me! Percebi muito cedo que seria pela escrita que eu iria "fugir".

CL - Podia falar-nos um pouco do seu percurso enquanto leitora?
AV - Nunca me lembro de não ter um livro nas mãos. Aprendi a ler e a escrever muito cedo e sozinha. Lia tudo o que encontrava. Chorava com aqueles dramalhões da Colecção Azul que as minhas tias liam. Muito mais tarde, com o andar dos tempos, comecei a aprender a ser selectiva, mas em miúda lia tudo e acho que foram os livros maus que eu li que me deram o gosto pela leitura: a vontade de ler mais, e mais... Lembro-me de ler e reler, e rerereler "A Princesinha", da Frances Burnett, e de nunca esquecer o que me ensinou Sarah, a menina rica que ficava muito pobre -  "mesmo em tempo de grande angústia nunca se deve perder a dignidade e o requinte". Mas o grande autor da minha infância, da minha adolescência, da minha juventude foi Erico Veríssimo. Na minha mesa de trabalho tenho uma grande fotografia dele, e tenho outra, mais pequena, que anda sempre na minha carteira junto das fotografias dos homens da minha vida... Hoje sou uma leitora compulsiva, não sigo nenhuma linha rígida de apetências literárias, é o que me apetece no momento. Leio muita
Poesia. Sempre. Sempre à cabeceira (ou na mala, quando viajo) o meu trio inseparável: Ruy Belo, Tolentino Mendonça, Daniel Faria.

CL - São prazeres distintos: o de ler, e o de escrever?
AV - A leitura é um prazer enorme. A escrita é um prazer muito doloroso, muito complicado, muito tempestuoso... Não tenho a escrita fácil, emendo imenso, deito fora livros já prontos se tenho a mínima suspeita de que sou capaz de fazer melhor. Não é uma paixão tranquila (se é que há paixões tranquilas...). Mas preciso dos dois prazeres para me sentir viva.

CL - A Alice Vieira tem-se também dedicado a uma recolha de conto tradicional português. Como tem sido essa experiência?
AV - É outro tipo de trabalho, outro tipo de escrita, outro tipo de linguagem e de ritmo. A literatura tradicional-- que, como se sabe, não é especialmente dirigida a crianças - interessa-me muito por aquilo que nos ensina de nós próprios, dos nossos medos, das nossas angústias, e também pelo que nos dá de outras gentes e civilizações.

CL – O conto tradicional parece guardar uma voz misteriosa...
AV - É a voz dos que tentaram entender a alma humana , e os mistérios da natureza, e a relação com o divino, e os obstáculos necessários à obtenção da felicidade - que é sempre aquilo a que se quer chegar.

CL - Falo do conto tradicional, mas a Alice Vieira é conhecida pela proximidade que mantém com o universo infantil e juvenil. Como mantém essa frescura e proximidade?
AV - Se calhar porque me sinto adulta, porque falo com eles como adulta que sou, e porque não faço nada de propósito para lhes agradar. De resto, quando escrevo sou terrivelmente egoísta: só penso em mim e se gosto do que estou a escrever, e se aquilo me dá prazer.

CL - O que gosta de fazer que não envolva ler nem escrever?
AV - Gosto de não fazer nada. Gosto de namorar. Gosto de almoçar com as minhas amigas. Gosto de ir às compras com a minha neta mais velha e de brincar com os mais novos. Gosto de ir ao ginásio. Gosto de estar nas esplanadas dos cafés. Gosto de ir ao fim da tarde aos concertos da Gulbenkian.

CL - Permita-me agora um desafio. Se pudesse saltar para dentro de uma história e alterá-la, em que história gostava de cair assim de supetão?
AV - Cansada como ando, adorava cair no conto da Bela Adormecida. O que ia alterar? Bom, talvez não dormisse cem anos. Mas cem dias de sono garanto que ninguém me tirava!

                                        in revista Círculo de Leitores, nº185

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